A localização de aeroportos em centros urbanos sempre foi uma questão delicada na aviação. Por um lado, a proximidade com áreas densamente povoadas facilita o acesso dos passageiros e reduz custos logísticos. Por outro, impõe sérios desafios à segurança operacional, especialmente em situações de emergência.
O dilema urbano: conveniência versus risco
A instalação de aeroportos próximos a centros urbanos foi uma escolha lógica no início da aviação comercial, quando os aviões eram menores e menos potentes. Com o crescimento das cidades, muitos aeroportos ficaram engolidos pelo tecido urbano. Casos emblemáticos como Congonhas (São Paulo), Santos Dumont (Rio de Janeiro) e LaGuardia (Nova York) ilustram esse paradoxo: são extremamente acessíveis, mas operam em áreas que oferecem pouquíssima margem de segurança em caso de falhas.
Infelizmente, diversos acidentes ao longo da história revelaram os riscos dessa proximidade. A escassez de áreas livres ao redor das pistas, o tráfego intenso de veículos e construções elevadas nas trajetórias de aproximação e decolagem são fatores que aumentam as consequências em situações anormais de voo.
Áreas de segurança: zonas que salvam vidas
Ao redor de uma pista de pouso e decolagem, existem zonas específicas definidas por normas internacionais, com destaque para as RESA (Runway End Safety Areas) — Áreas de Segurança no Fim da Pista. Elas devem ter, idealmente, no mínimo 240 metros de comprimento além da cabeceira da pista, podendo chegar a 300 metros ou mais, dependendo da operação.
Essas áreas são fundamentais para absorver ou reduzir os danos em caso de uma excursão de pista. Em aeroportos urbanos, porém, a implantação completa dessas zonas é muitas vezes inviável por falta de espaço físico. Quando não é possível atender ao padrão, utilizam-se alternativas como EMAS (Engineered Materials Arrestor System) — sistemas de frenagem projetada, mas com alto custo de instalação e manutenção.
Além da RESA, há zonas protegidas para evitar construções próximas à trajetória dos aviões. O Plano Básico de Zona de Proteção de Aeródromos (PBZPA) define limites de altura para edificações, respeitando ângulos de subida e descida das aeronaves. Ainda assim, em cidades densamente ocupadas, vemos prédios residenciais a menos de 1.000 metros das cabeceiras, o que compromete seriamente a segurança em caso de falhas de motor na decolagem, por exemplo.
Quando o afastamento é solução — e problema
A solução mais segura seria manter os aeroportos afastados das zonas centrais, como ocorre com Guarulhos (SP), Viracopos (Campinas) e Brasília (DF). Isso proporciona áreas de escape maiores, permite crescimento futuro da infraestrutura e reduz o risco de tragédias urbanas em caso de acidentes.
No entanto, há uma contrapartida: o custo e o tempo de deslocamento. Passageiros precisam de transporte eficiente — trens, ônibus rápidos ou vias expressas — para que o acesso continue competitivo. Sem isso, os aeroportos afastados se tornam impopulares, como aconteceu com o aeroporto de Jundiaí (SP) no passado, que não conseguiu atrair voos comerciais por falta de conectividade.
Conclusão: segurança que respeita o entorno
A aviação moderna exige um equilíbrio entre eficiência operacional e responsabilidade urbana. A localização de um aeroporto não pode ser decidida apenas pela facilidade de acesso. É preciso avaliar os riscos ao entorno, garantir zonas de segurança adequadas e pensar em políticas urbanas que respeitem os limites do espaço aéreo.
A história da aviação já nos mostrou que aeroportos encravados no meio das cidades tendem a repetir tragédias — basta lembrar dos acidentes de Congonhas (2007) ou Medellín (2016). Por isso, qualquer planejamento sério de infraestrutura aeroportuária deve incluir zoneamento urbano inteligente, respeito aos planos de segurança, e uma visão de longo prazo que priorize a preservação da vida humana.
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